
Em tempos de COVID-19, é urgente aumentar a conscientização sobre a obesidade, suas comorbidades e seus riscos.
É urgente entender que a obesidade é uma doença, aumentando a compreensão de sua causa multifatorial e mudando a percepção e a nossa resposta como sociedade ao excesso de peso.
Agora, mais ainda, priorizar o combate à obesidade é uma questão chave de saúde pública.
São mais de 800 milhões de pessoas em todo o mundo vivendo com obesidade. A obesidade infantil tem uma previsão de aumento de 60% na próxima década – já são mais de 300 milhões de crianças e adolescentes com obesidade. No Brasil, estima-se que entre 10% e 15% das pessoas entre 5 e 19 anos têm obesidade. Em adultos, 62% têm excesso de peso e 27% têm obesidade. O sedentarismo, também diretamente associado à obesidade, acomete até 64% da população brasileira.

Os custos estimados com a obesidade são de cerca de US$ 2 trilhões anualmente, representando 2,8% do PIB mundial.
Por ser uma das principais contribuintes para a mortalidade geral da população, agir contra a obesidade (incluindo sua prevenção e tratamento) é de máxima importância.
Dados publicados recentemente mostraram que o excesso de peso é agora responsável por mais mortes do que fumar. A porcentagem de todas as mortes atribuíveis ao tabagismo caiu de 23% em 2003 para 19% em 2017, enquanto as mortes por excesso de peso aumentaram de 18% em 2003 para 23% em 2017.

Essa pandemia relacionada ao excesso de peso pode ser devastadora e mais grave que muitas outras doenças. Na realidade, a obesidade é causa de outras doenças como diabetes tipo 2, doença gordurosa do fígado, depressão, distúrbios do sono, artrose, hipertensão arterial, aumento de colesterol e triglicerídeos, isquemia do coração, derrame cerebral e até mesmo câncer.

Quem tem obesidade é quase três vezes mais propenso a desenvolver diabetes tipo 2, sendo que aproximadamente 40% dos novos casos de diabetes são diretamente atribuíveis à obesidade.
A obesidade pode ser responsável por mais de 12 tipos de câncer. Um maior tempo sedentário é associado a um risco até 52% maior de morte por câncer. A substituição de 30 minutos de tempo sedentário por uma atividade física de moderada intensidade reduz o risco de câncer em 31%.
Em um estudo com mais de 550.000 adultos, foi constatado que pessoas com obesidade que intencionalmente perderam em média 13% do peso corporal reduziram o risco de desenvolver diabetes tipo 2 em 42 – 44%, apneia do sono em 22 – 27%, hipertensão arterial em 18 – 25% e dislipidemia (aumento de colesterol e triglicerídeos) em 20 – 22%.

Atualmente está ocorrendo uma piora desse cenário de sindemia – combinação das pandemias de obesidade e de COVID-19, com as pessoas aumentando o tempo sedentário, reduzindo a prática de exercício físico, aumentando o consumo de alimentos não saudáveis, desenvolvendo ansiedade e depressão, o que resulta em um maior ganho de peso. Estamos agora constatando o quanto é precária a saúde metabólica da nossa sociedade, com casos de maior gravidade e pior evolução da infecção pelo coronavírus. Pessoas com obesidade têm mais internações, maior tempo de hospitalização, mais indicação de UTI e intubação e maior mortalidade.
Um estudo publicado agora avaliou o risco de hospitalizações em mais de 900.000 casos de COVID-19 nos EUA e mostrou que a maioria foi relacionada com uma de quatro condições cardiometabólicas: 30% foram atribuíveis à obesidade, 26% à hipertensão, 21% ao diabetes e 12% à insuficiência cardíaca.

Além disso, os pesquisadores estimaram que uma redução de 10% em cada uma dessas quatro condições cardiometabólicas teria potencialmente a capacidade de evitar 11% das hospitalizações por COVID-19.
A COVID-19 está enviando ao mundo um alerta sobre nossa falta de ação em relação às doenças metabólicas e cardiovasculares.
Nós conhecemos muitas das soluções para prevenir e tratar a obesidade, mas mais do que palavras e promessas, agora precisamos de ações verdadeiras. A obesidade tem sim prevenção e tratamento. Os dias em que a obesidade e as doenças cardiometabólicas eram apenas problema dos outros já se foram, pois diretamente ou indiretamente, todos nós somos ou seremos afetados de uma forma ou outra.
Precisamos deixar de acreditar que ter obesidade é uma questão de opção ou de relaxamento pessoal. Sem estigmatizar e centrando de forma humanizada na pessoa, devemos minimizar a pandemia da obesidade, estimulando a alimentação saudável, a diminuição do tempo sedentário, a prática de exercício físico regular e o acesso ao tratamento adequado. Esta é uma chamada de ação para a sociedade como um todo, para todas as formas de mídia, para os gestores públicos e privados da Saúde e para cada um de nós, cidadãos.
Autor
Clayton Macedo, MD, PhD
Doutor em Endocrinologia Clínica
Especialista em Medicina do Esporte e do Exercício
CEO Médico da Haux Company
Prof. da pós-graduação em Endocrinologia e Medicina Esportiva da UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo
Coordenador do Núcleo de Endocrinologia do Exercício (Medicina Esportiva – UNIFESP)
Presidente da Comissão Temporária de Estudos em Endocrinologia do Exercício da SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia
Coordenador do Departamento de Atividade Física da ABESO – Associação Brasileira de Estudos da Obesidade e Síndrome Metabólica
Membro do Departamento de Atividade Física da SBD – Sociedade Brasileira de Diabetes
Fontes:
Editorial do The Lancet Diabetes & Endocrinology, abril de 2021; ECOICO – European and International Congresso on Obesity, setembro de 2020; Journal of American Heart Association, abril de 2021 e The Lancet, janeiro de 2019.




